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domingo, 20 de fevereiro de 2011

[Trecho] A Guerra Santa

O MERCENÁRIO

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Existe um bar na periferia de North City que apesar da pouca badalação em comparação as boates e aos pubs do centro e da região litorânea da cidade, é tão frequentando quanto. No entanto, por mais que o movimento no local perpetue até as mais altas horas da madrugada, seus frequentadores passam longe do glamour vivido pelos atores, atrizes, músicos, empresários, esportistas e políticos que contemplam aqueles ambientes com suas ilustres presenças. Seus fieis frequentadores em contrapartida, não passam de gângsteres, prostitutas, cafetões, viciados e pessoas em geral com uma miserável perspectiva de encher a cara de cerveja, dar umas tacadas de sinuca assim como uma foda com as namoradas e se tiverem tempo, arranjarem uma briga durante esse meio termo. O estabelecimento atende pelo simpático nome de TOCA DOS RATOS e o cheiro lá dentro não é os dos melhores. Uma mistura de cevada e nicotina. Isso para não mencionar os banheiros.
Um homem estava sentado em uma mesa completamente consumida pelo vandalismo dos frequentadores. Há 3 dias, tal mesa serviu como um escudo numa tentativa mal sucedida de esfaqueamento. O cidadão que ia ser apunhalado ergueu a mesa em defesa aparando o objeto pontudo que lhe penetraria no peito. O atacante no ato de tentar tirar a faca enterrada naquela madeira, perdeu segundos preciosos, dando assim a oportunidade do defensor contra golpear com uma garrafada bem no centro de sua cabeça fazendo-o cair desfalecido.  Havia vulgaridades entalhadas na mesa, algumas sem nexo, outras engraçadas que chegou a fazer o homem emitir um espectral sorriso no canto dos lábios. Vulgaridades como : ESCREVI, SAÍ CORRENDO, PAU NO CU DE QUEM TA LENDO.  XOXOTA É MUITO BOM.  BOCETA TINHA QUE NASCER EM ÁRVORES.  A garçonete chegou e deixou a cerveja que pedira sobre aquela superfície judiada e empoeirada. O homem agradeceu com um simples menear de cabeça. Seus cabelos eram rubros como o sangue e desgrenhados como o de um morador de rua. A barba quase alaranjada por fazer, percorria a extensão de seu rosto criando uma camada de pelos sobre sua tez. Uns óculos escuros de aros redondos escondiam seus olhos, embora o ambiente fosse mal iluminado, ele insistia em não tira-lo do rosto. Um cigarro pendia no canto de sua boca, havia algumas herpes naqueles lábios. Vestia uma descolada jaqueta de couro preta sobre uma blusa também preta com as iniciais J. W. estampada. Usava um jeans surrado que exibia seu joelho esquerdo, e uma grotesca bota de xerife do velho oeste cobria seus pés. Seu nome, JACK WEST.
Alheio às tacadas de sinuca e ao burburinho instaurado na Toca dos Ratos, Jack West observava com olhos vítreos um papel que acabara de tirar do bolso da jaqueta.  O conteúdo do papel era algo que lhe interessava, mais do que isso, era algo diferente de todos os trabalhos que já executara até então, algo que lhe dava uma ambígua sensação de temor e anseio. Indubitavelmente, a missão mais difícil de sua longa carreira de assassino.
- Snake, o grande manipulador das chamas, o homem que ao lado de Spider, o mestre dos raios, destruiu a cidade de Paladium.  – Ele balbucia.
Ele tira o cigarro da boca e amassa a guimba contra a própria mesa por falta de um cinzeiro. O papel tem outra folha anexada e West passa os olhos nos anexos sem muito interesse. 
Nesse curto período, surge no bar uma jovem de 17 anos munido de um belo par de pernas, vestida com um minúsculo short jeans que está mais para um cinto do que para um short propriamente. Sua bunda fica bem evidenciada naquelas vestes. Seu nome é Ju Felina, tem um longo cabelo preto de índia que vai a altura da cintura, seios medianos escondidos por um top branco e usa brincos de argolas. Seus lábios são grossos e lentes verdes ornam seus olhos lhe dando um certo charme.  Ju passa sob os olhares contidos de todos os homens ali presente. Seus saltos, estalam a cada passada. Ela caminha com um olhar imponente e o nariz empinado não ligando se está esbarrando nas mesas pela Toca dos Ratos e tampouco, esquentando se está pisando no pé de alguém. Esbarra na mesa cujo um homem ruivo ler um papel fazendo sua long neck oscilar naquela superfície. O ruivo apara a garrafa evitando-a que caia. Porém ela chama sua atenção e por alguns segundos, ele a observa com um olhar vagamente ardoroso com relação aquele traseiro. Porém, não demora em voltar a se concentrar em seu trabalho.
Otto Heidfelt, conhecido como O Garra, devido a uma enorme tatuagem de uma garra de tigre em suas costas, está diante do balcão e se irrita com o que acabou de ver. Ele fita o desconhecido sobre a mesa a 10 metros de distância e franze seu cenho num único sobrolho. Ju Felina chega perto dele e o beija calorosamente apertando suas unhas postiças contra o seu peito. Porém, mesmo beijando-a, seus olhos não deixam o desconhecido.
- O que foi Garra ? – Ela indaga.
- Aquele homem – ele aponta para West – aquele homem teve a coragem de olhar pra você diante da minha presença.
Ju dá um suspiro que denota.  Ah, outra vez isso. E contemporiza lamentando não ter entrado no bar como uma cidadã normal:
- Deixa isso pra lá, Garra, ele deve ser apenas um viajante perdido.
Otto aperta com forças as magras bochechas dela e a olha bem nos olhos com fúria.
- Escute aqui! Ninguém, olha pra mulher do Garra, entendeu bem? Ninguém!
Ju diz algo, porém sua voz sai indecifrável.
- O que está dizendo?  - Ele pergunta.
Ela se livra do rude aperto de Garra e repete.
- Está me machucando seu imbecil!
Garra estala os dedos e dois brutamontes que jogavam uma partida de sinuca se põem a disposição de imediato interrompendo a disputa.  Um careca alto com uma bizarra cicatriz em forma de X na testa e com inúmeras tatuagens nazistas pelos braços, junto de um corpulento homem com a barba ocupando boa parte do rosto, usando uma bandana do Sepultura, com uma barriga protuberante a alguns centímetros além do cinto da calça, se aproxima de Otto.
- O que foi Garra? – Perguntou o careca.
- Aquele sujeitinho ali perdeu a noção do perigo. – Limitou-se Otto.
- Aquele com o cabelo de fogo? – Apontou o barbudo.
Otto assente.
- Vamos lá ter uma palavrinha com ele. – Disse o barbudo estalando os dedos da mão direita contra a palma da esquerda.
- Garra, por favor. – Insistia Ju.
- Não se meta nisso, Ju. – Garra espalmou a mão para ela.
West acabara de dobrar o papel e por no bolso de sua jaqueta quando 3 sujeitos pararam diante de sua mesa.  Jack ergue os olhares para eles e reticente, saboreia o ultimo gole de sua cerveja. Os homens permanecem impassíveis e com caras de poucos amigos encarando-o. Com toda a serenidade do mundo, West pergunta:
- Algum problema, rapaziada?
- Está vendo aquela mulher ali parada em frente ao balcão? – Garra aponta para Ju – Ela é minha namorada.
- Meus parabéns – responde Jack – é uma bonita moça, apesar de ser um pouco nova pra você, não acha?
O sangue subiu a cabeça de Otto a ponto de apitar pelas orelhas como uma panela de pressão. Naquele instante, por mais que aquele forasteiro se curvasse aos seus pés e lambesse suas botas, não seria suficiente para escapar de uma boa surra. Com os dentes trincados, ele rosnava:
- Ninguém olha para ela, entendeu? E ninguém zomba da minha cara!
Jack West ergue as duas mãos até a altura dos ombros e com um dissimulado sorriso se desculpa:
- Ora, não me leve a mal, cavalheiro, eu não sabia que ela era sua namorada e eu não olhei para ela com olhos libidinosos. Olhei apenas por curiosidade. Vamos fazer o seguinte, eu pago uma cerveja para vocês e esse mal entendido acaba por aqui, o que me diz?
Otto hesita por um milésimo de segundo, contudo, pega a garrafa vazia sobre a mesa e a quebra na quina formando uma arma pontuda e perigosa. As conversas e as tacadas que aconteciam na Toca dos Ratos cessam de imediato. Todas as atenções estão voltadas para eles.
- Abaixa essa garrafa, cara, acha mesmo que tudo isso vale a pena a terminar assim? Por que simplesmente não aceita a minha cerveja? – Falava West.
- Acho que esse falastrão está a fim de perder a Língua, Tom. – Falava o careca ao Barbudo.
- Eu também acho, Kerry, está falando demais pro meu gosto. – Replicava o barbudo.
-Bem, eu não quero confusão, se me deixarem apenas ir embora, eu vou agradecer, pois não quero machucar ninguém aqui. – Dizia Jack levantando-se lentamente ainda com as duas mãos erguidas.
Embora o sujeito seja tão alto quanto eles, os três se entreolham e dão uma longa risada.
- Você parece que não entendeu – rosna Garra – a pessoa que vai sair machucada aqui, é você!
Assim que acabou de falar, Garra se precipita em ataque na direção de Jack West. Em um movimento uniforme, ele tenta atingir Jack na altura do abdômen levando a ponta da garrafa em uma linha reta. Todavia, West em uma lépida e ágil técnica evasiva, se esquiva facilmente do golpe e segura o braço direito de Garra.
- Eu disse que não queria machucar ninguém! – Rosna West agora com os dentes trincados.
Em um curto instante de tempo, do ataque precipitado de Garra a defesa de Jack West, o ruivo quebra o braço do valentão deixando-o em um ângulo hediondo. Foi possível ouvir o estalo dos ossos se quebrando em 3 partes diferentes. O esgar foi inevitável na expressão de cada um ali que testemunhava aquela briga. Otto urrava um grito esganecido e implacável de dor. A mão que segurava a garrafa se abriu como uma aranha espatifada não tendo forças nem para segurar uma pena. Seu braço agora estava mais para um S do que um membro de seu corpo. As lágrimas desciam de seus olhos e toda a sustentação de sua perna se foi. Caiu de joelhos com a mão esquerda apalpando a arruinada parte de seu corpo como se ela pudesse curá-lo.
- Ahhhhhh! Meu braço, ele quebrou meu braço! – Gritava Otto.
Perplexo pela agilidade do oponente, Kerry, o careca, avançou sem confiança para atacar, porém, antes mesmo que pudesse erguer os punhos e efetuar um único soco, West num piscar de olhos, já estava a 5 centímetros dele e o careca da cicatriz levou um soco que parecia mais um atropelamento de carreta do que propriamente um soco. Voou uma distancia de mais ou menos 10 metros. Atravessou por cima do balcão e se chocou contra as prateleiras espelhadas quebrando inúmeras garrafas. O golpe lhe provocou um deslocamento de maxilar que Kerry tivera de alimentar a base de líquido por 6 meses tendo também de se comunicar a base de papel e caneta por quatro.
Tom, não estava mais confiante, não estava hesitante e tampouco estava com medo. Estava horrorizado. Diante dos olhos incrédulos das pessoas que ele sempre intimidou, não sabia se demonstrava uma dignidade e enfrentava o forasteiro, ou se preservava a sua integridade física e fugia como uma criança assustada. Olhou para trás e se assustou com a distância que o soco dele fizera com que um grandalhão como Kerry, fosse arremessado. Olhou para baixo e viu Otto completamente inutilizado com seu braço apontando em 4 direções diferentes. O tempo era curto e ele tinha que decidir logo; Jack West dava passos em sua direção. Todavia, havia uma saída, pelo menos ele julgou que fosse uma.  O barbudo Tom levou a mão para trás e de lá tirou um .38 que jazia sob a sua blusa, presa na altura do cóccix. Rapidamente, ele a apontou para Jack West com suas mãos trêmulas de indecisão e medo. Houve um pequeno alarido quando Tom sacou o revólver, por mais que o bar fosse barra pesada, jamais houvera um assassinato no local.
- Para trás! – Gritava Tom – Para trás ou eu juro que meto uma bala nessa sua cara!
Jack West ignorou os imperativos e continuou a avançar na direção de Tom que caminhava para trás. Tirou o óculos do rosto revelando seus olhos implacáveis, seus olhos assassinos num cruel verde rubi.
- Você é louco? Não vê que estou armado? – Dizia Tom com a voz mais trêmula do que uma garotinha.
- Se está armado, por que não atira? – Desafiava West.
Tom era um rato encurralado. Não tinha saída, se quisesse ter alguma chance de levar a melhor naquele embate teria de puxar o gatilho. E, como Jack West continuava avançando impiedosamente em sua direção com seus olhos desafiadores e cruéis, ele assim o fez.
Um estampido ecoou na Toca dos Ratos. A Maioria das testemunhas fecharam os olhos de imediato não querendo presenciar tal espetáculo dantesco. Porém, assim que abriram, viram o mesmo forasteiro de pé diante de Tom. Dessa vez, ele tinha o braço esquerdo erguido na altura do rosto com o punho fechado.
Será que Tom errou o tiro? Esse foi o questionamento que rondou a cabeça de todos ali presente. Contudo, quando Jack West desfez o punho cerrado, o projétil do .38 caiu de sua mão como um truque de mágica, fazendo um barulho metálico ao atingir o chão. A perplexidade foi tamanha.
- Q-Q-Q-Q- Quem é você? –Perguntou Tom com os olhos formando dois Os em sua face.
- Eu me chamo Jack West. – Respondeu o forasteiro antes de socar a enorme pança de Tom fazendo-o vomitar tudo que comera naquele dia. Há quem dissesse que vomitara a própria merda. O barbudo se viu perdendo todo o ar.  Foi como ser atingido por um meteoro incandescente bem na boca do estomago. Segundos após vomitar, tudo ficou baço em sua visão e ele caiu de cara na sua própria nojeira.
Jack olhou ao redor e pela primeira vez desde a inauguração da Toca dos Ratos em North City, o silêncio reinou. Salvo é claro, pelos gemidos agonizantes de Otto com seu braço completamente destruído. Ele foi ao balcão e perguntou quanto custara a cerveja. A garçonete que naquele momento não sabia nem qual era o número de seu sapato devido ao seu sumo estarrecimento, gaguejou tanto que fora impossível manter uma comunicação básica. West assentiu e deixou uma nota de 5.
- Pode ficar com o troco.
Tornou a por de volta os óculos de volta no rosto e saiu do bar para cumprir a sua missão.